Gostaria de ser um pintor,
para retratar com fidelidade esta região, transmitir
a uma tela a essência destes lugares, seus caminhos,
sua vegetação e suas águas, ladeadas
de buritis. Um escritor, para transmitir as nossas emoções
em percorrer essas trilhas, conhecer as pessoas e descrever
com propriedade o ambiente. Como não sou nada disto,
tenho que recomendar a leitura de Guimarães Rosa,
Grande Sertão
: Veredas.
Descendo mais pelas trilhas, bem à frente, entramos
em um cerrado, tão fechado que a trilha era um túnel,
de sombras e escuridão. Logo à frente vi dois
bois, que subiam puxando um modesto carro-de-boi. Parei! O
carreiro, esperto não teve dúvida, tocou o carro
no meio do cerradão. A fotografia está péssima,
foi tirado do filme da câmara. Mas, pode-se ver, que
o carro-de-boi, estava carregado, ou melhor carregando, apenas
alguns paus de lenha. Cumprimentei o carreiro com deferência,
pois há décadas que não vejo uma junta
de boi puxando um carro. A cena ficou marcada em minha mente,
como mais um acontecimento de volta ao distante passado de
minha infância. Oh! Sertão, recordações
prazerosas de um passado de homens de respeito.
Neste momento lembrei de um trecho de Guimarães Rosa:
“Mas, por entre árvores, se podia ver um carro-de-boi
parado, os bois que mastigavam com escassa baba, indicando
vinda de grandes distâncias”.
Chegamos ao fundo do Cânion, antes
do rio principal, Rio Pardo, passamos por vários riachos,
sendo o principal deles o Rio Das 3 Passagens, onde estamos..
Aí esta uma das três passagens do rio. Zelão
atravessa o rio intrépido com sua possante L-200. Podemos
ver os buritis demarcando a Vereda do Vão dos Buracos.
O azul anil do céu nos dava uma visão quase
irreal da paisagem. Tínhamos vontade de sentarmos,
e deixar o tempo passar manso, como as águas do riacho.
Parar e limpar a mente, como limpas eram as águas que
banhavam a praia a nossa frente. Mas tínhamos objetivo,
destino, às vezes isto atrapalha muito nosso sonho.
Aí estamos, no Vão dos Buracos, no Córrego
das Três Passagens, um afluente do Rio Pardo. Na realidade
o rio corre por uma linda vereda, ladeada por íngremes
escarpas.
As famílias dos sertanejos moram ao longo do curso
do Rio. A descrição de um lugar como este, nos
faz retroceder no tempo, cem ou cento e cinqüenta anos
atrás. O mesmo modo de vida, uma felicidade nata pelo
simples motivo de sobreviver às adversidades.
Para nos todos foi uma grande lição de vida,
conhecer as pessoas deste lugar. Saímos reconfortados
de suas humildes casas, levando na mente o que se pode fazer
do pouco, e nos sentirmos muito, muito felizes, do muito que
Deus nos deu.
Vendo estas pedras arredondadas do fundo do rio novamente
recordo-me de Guimarães Rosa: Até as
pedras do fundo, uma dá na outra, vão-se arredondando
lisas, sem pressa para um longo tempo na eterna erosão
dos tempos.
Zelão veio rasgando com sua L-200, “pé largo”
, quando viu o rio se entusiasmou e...
pisou fundo, na segunda reduzida, um espetáculo bonito
de se ver...
saiu garboso do outro lado. Mas, não estava contente.
Sentiu que o fundo do rio era areia e quis fazer novamente
a travessia...
aí deu o show, a caminhonete sumiu na nuvem d`água
que se formou, foi bonito de ver.
No caminho ao longo do cânion fomos
passando pelas casas típicas dos moradores do vale.
Nesta casa, do senhor Nicolau, serve almoço, se for
avisado, pelo rádio de FM de Chapada Gaúcha.
O guia não pode dar o aviso pois a rádio está
temporariamente fora do ar, tem uma válvula queimada.
Paramos um pouco e depois seguimos nosso caminho, para o Sr.
Zé Bandeira.
Depois de 20km de trilhas, de relativa dificuldade, encontramos
o lendário senhor Zé Bandeira, morador de grandes
distâncias. Homem que é uma história viva
destes esquecidos sertões e veredas. Nós o encontramos
debaixo de um grande pé de jatobá, carregado
de frutas. Do jatobá eles extraem a polpa para fazer
farinha e a semente tem grande valor para fazer artesanato.
Sua postura na fotografia em nosso primeiro encontro, mostra
o orgulho de um sertanejo octogenário com o machado
nas costas. O olhar, inquirindo, quem veio? Porque vieram?
O que queriam? Quando viu o guia se desarmou em hospitalidades.
Ao longe se vê o contraforte de pequenos morros, das
ravinas abruptas do Vão dos Buracos.
Seu Zé Bandeira, tem 80 anos, mas estava a uns 2km
de casa, com um machado na mão, pois ia cortar um pau
para fazer um portãozinho. Sua recepção
foi calorosa, foi conosco para sua casa e ia mandar preparar
o almoço para nós.
Este é o majestoso pé de jatobá, carregado
de frutas. Em suas sombras paramos, para ouvir o melancólico
e harmonioso canto do sabiá laranjeira, estava em sua
copa, mas não conseguimos vê-lo. Ao lado da segunda
foto começa a trilha que leva à casa do Senhor
Zé Bandeira.
Caminhando a passos largos para a casa do Sr. Zé Bandeira,
a esposa com ar de hospitalidade me aguarda. Momento de encontro
com a essência do sertão.
Esta é a famosa casa do senhor Zé Bandeira.
Ele nasceu neste lugar a oitenta anos, e esta é sua
dedicada esposa: lépida, animada e hospitaleira. Ela
teve mais de 10 filhos.
Que hoje estão espalhados pelo sertão e cidades,
Chapada Gaúcha e Arinos.
Já estava pronta para matar um frango e fazer um almoço,
eu delicadamente declinei, mas aceitamos uns bolinhos fritos
típicos da região e café, estavam ótimos.
Comemos à vontade.
Em cada casa de moradores que passávamos,
pedíamos ao guia que deixasse discretamente uma cesta
básica, para auxiliar! No fim o guia pediu uma para
ele também. Ficou feliz em ganhar!
Existem coisas básicas que faltam no sertão!
Este é o fundo da casa do senhor Zé Bandeira,
grande contador de histórias. Aparece a sua filha mais
nova.
Por fé ao santíssimo, ele fez um cruzeiro de
madeira (uma cruz), bem grande, e subiu no alto da montanha,
que fica frente a sua casa, e a enterrou lá no cume.
Foi muito sacrifício, mas seu lugar tornou-se um ponto
de meditação e a montanha “criou vida”.
Mas, ele estava muito triste com um conhecido seu, que é
evangélico, e ao ver a cruz no alto da montanha, disse:
- Isso é bobagem, Zé Bandeira, se eu fosse você
subiria lá novamente e jogava morro a baixo esta cruz!
Isso ofendeu demais o seu Zé. Ele perguntou-me numerosas
vezes:
- O senhor, doutor, que é letrado, o que acha disso?
- Bem, respondi. Nada é mais importante que sua fé
seu Zé Bandeira, seu esforço em colocar esta
cruz naquele alto de morro. Para mim o senhor em nome de Cristo,
tomou posse daquele cume da montanha. Para mim essa sua atitude
foi muito importante. Enquanto eu viver não vou me
esquecer de “sua” montanha, de sua casa abençoada e
de sua fé. O importante, senhor Zé, não
é o que os outros pensam mas, o que o senhor sente.
Parece-me que ele se acalmou e quis ver na filmadora a imagem
de sua cruz que ia para o “exterior”.
José Fernando e Marcelo, com o casal Zé Bandeira,
em frente à casa. No “quintal” da casa, passa o ainda
jovem Rio Pardo, ele acabara de nascer nas vertentes do Vão
dos Buracos, não mais do que 20km a montante de onde
estamos. Ele também é fruto de dezenas de “sangradouros”
do Aqüífero Urucúia.
Aí estão todos os companheiros às margens
do alto Rio Pardo, junto ao Sr. Zé Bandeira. Ficamos
maravilhados com o cenário. Não dá ser
visto na fotografia, mas no alto da montanha está o
cruzeiro do senhor Zé Bandeira.
A água do rio é muita limpa. Observando bem,
os grãos de areia do fundo, e alguns pedregulhos maiores,
notamos que tudo vai lentamente descendo, corrente a baixo.
Uns rolando sobre os outros, polindo, arredondando. Os maiores
ficam menores ainda, e a cada tempo mais redondos e polidos,
alguns são puro quartzo, parecem até diamantes.
Formam ondulações nos leitos, traçam
desenhos nas curvas, depositam nos barrancos nas cheias, em
fim, contam de forma incontestável sua história
e sua origem a séculos e séculos passados.
O rio serpenteando pelos vazios dos grandes espaços
criou o grande cânion. Erodindo suas encostas, esculpiu
suas vertentes. Depositando seus detritos formaram as veredas,
levando as sementes as enfeitaram com os buritis.
Estamos debaixo de uma mangueira ouvindo as histórias
de Sr. Zé Bandeira. Contou bastantes casos das maldades
do jagunço Antônio Dó. De uma capanga
de couro que ele usava, cheia de mandingas que o protegia
dos tiros, somente morreu quando foi tomar banho e estava
sem a bolsa de couro. Não o mataram com tiro, mas,
com uma mão de pilão esmagaram a cabeça
dele. Antônio Dó teve 19 filhos com várias
mulheres.
Depois de muitas histórias, que nos fizeram voltar
no tempo: “Zé Bebelo o chefe dos jagunços, busca
o malvado Antônio Dó. Cruzaram essas veredas
esparramando chumbo para todos os lados”. O senhor Zé
Bandeira se entusiasma, em suas narrativas. São casos
contados que passam de pai para filhos.
No livro de Grande sertão : Veredas,
Zé Berbelo, é descrito como um homem que se
preocupou em saber, estudou, era preparado. Pessoalmente uma
bela figura, queria ser político para combater os jagunços.
No final vira um jagunço também. O impressionante
é: Estas personalidades não existiram, saíram
da mente de um grande escritor. Tornaram-se tão vivos
no imaginário popular, que os associando a outras pessoas
que realmente existiram, contam as histórias como verdadeiras.
Ver senhor Zé Bandeira descrever as travessias de Zé
Bebelo, por este cânion, pela Serra das Araras, a ouvir
os fatos ocorridos é assistir histórias. Imagine,
o irmão do pai dele se encontrou com o bando, em um
ato heróico, tirou a garrucha da guaiaca para se defender.
Mas, eram mais de 50 jagunços, ele parou, estático.
Os jagunços não o mataram, pois o julgaram muito
valente, mas o obrigou dar os dois tiros da garrucha, calibre
28, bem perto do ouvido. Isto o deixou surdo por muito tempo.
Assistindo, senhor Zé Bandeira, contar com uma riqueza
de detalhes tão impressionante este fato e outros,
tem-se certeza que os fatos aconteceram mesmo.
É o velho dito: Não creio em bruxarias mas,
que elas existem; existem mesmo!
Aí, neste instante, como uma sombra silenciosa, aparece
a dona da casa, com dois pratos de quentes biscoitos e uma
garrafa térmica de café. Quebram-se os liames
do passado. O perfume dos petiscos e do café, nos trás
de volta ao presente, que também é passado e
sentimos um impulso irresistível de nos harmonizarmos
com o ambiente. Solidarizarmos com aquela frágil mulher
na aparência, mas no íntimo uma fortaleza, de
amor, solidariedade e hospitalidade.
Onde, onde poderíamos encontrar um ambiente assim?
Pensando em tudo isso e vendo esta e outras fotografias, imagino
os idos tempos, das longas conversas à sombra de um
pé de jatobá, sem buzinas, sem celulares, sem
televisões, sem tempo passando, mas deixando o tempo
passar. Ouvindo o doce canto do sabiá, as maritacas
em algazarras nos buritis, araras Canindé cruzando
o azul do espaço, é a paz, são momentos
inesquecíveis de nossa atribulada vida.
Devido às boas conversas fomos esvaziando rapidamente
as vasilhas de biscoitos. Todo mundo ficou muito contente
pela ambiente e a hospitalidade. Acima de tudo, nos emocionamos
muito. Hoje sinto uma vontade grande de voltarmos lá,
deixar o tempo passar, perpetuando o mais simples de nossos
sentimentos: a paz, a simplicidade e o carinho de um encontro.
Todos se confraternizam. Os biscoitos, quentinhos e cheirando
bom, vão chegando. Ninguém se faz de rogado
e os pratos se esvaziam. Seu Zé Bandeira continua tecendo
um cordão de fibra de buriti e contando casos do Antônio
Dó e seus jagunços.
E como dizia o finado tio Ranulpho: “ Barriga cheia pé
na Areia”.
Nos despedimos respeitosamente da família de senhor
Zé Bandeira e fomos para a Vila Serra das Araras.
PÉ NA ESTRADA:
Subindo as rampas dos Vão dos Buracos. É 4X4
e reduzida. O guia nos disse que um dia foi com turistas em
uma perua Fiat, tiveram que voltar empurrando.
Poeira Vermelha do Sertão. Quando se tentava chegar
perto do companheiro da frente, tínhamos que parar
pois não se via nada. Ficava-se perdido no meio de
um pó fino, que penetrava por todos os poros. Esta
poeira é o atestado do Complexo do Urucúia.
Estamos na estrada que sai de Chapada Gaúcha e vai
para Vila Serra das Araras, depois desta cidadezinha, tem
uma encruzilhada. A esquerda, ela segue em direção
ao nordeste para Januária, e a direita para sudeste
para a cidade de São Francisco.
Nesta fotografia, ao longe estamos vendo a Serra Mariana onde
nasce o Rio Catarina que passa pela Vila Serra das Araras.
Neste ponto o guia nos leu um trecho do livro Grande Sertão
: Veredas, e pela descrição do autor, nestas
serras passaram os Jagunços de Medeiro Vaz, passando
pelas Serra das Araras, chegaram onde hoje é a cidade
de Chapada Gaúcha, desceram o “Roi Rampas”, passaram
pelos morros dos Três Irmãos. Guimarães
Rosa descreve esta área como o Liso do Sussuarão,
que iria até o Rio Carinhanha. Verdadeiro deserto onde
a canícula fustigava os animais, a sede o cansaço
impediram de atingirem o Carinhanha e chegar à Baía,
para dar combate ao jagunço Ricardão.
Aí estão o guia e o Fábio. O guia está
lendo o trecho de Grande Sertão : Veredas, sobre o
que eu escrevi da Serra das Araras, lutas e travessias. Atrás
está a estrada de terra que nos levará a Vila
das Araras. Neste alto do chapadão, 880m, tivemos uma
visão ampla de toda a região a Este de Chapada
Gaúcha. São campos e cerrados a perder de vista.
Fiquei imaginando, montado em uma mula, marchadora, qual seria
a sensação de cruzar esses estirões enormes,
os animais resfolegantes subindo rampas, e ao final, o vazio
das distâncias se confunde com o distante horizonte.
Que benção deveria ser chegar a uma vereda,
apear, tirar o arreio, beber água, fazendo uma folha
de imbaúba de copo, lavar o rosto, ouvindo o som onomatopaico
das animálias sugando água em grande quantidade,
pois a sede era muito antiga e bastante viajada.
Por vezes acendiam um foguinho, para esquentar água
e fazer um café, a ser bebido com pó e tudo,
e também para umedecer a farofa de carne seca da matula.
Depois os homens deviam procurar uma sombra fugindo do calor
do meio dia. Os animais, se chafurdavam na água, pastavam
o verde capim das margens, para recompor as energias e enfrentarem
mais à tarde novos estirões, até a próxima
vereda.
Assim, as veredas, as aguadas, sempre foram os balizamentos
dos tropeiros, jagunços ou viajantes.
A Serra Mariana vista com a teleobjetiva da filmadora. Na
realidade, essas escarpas não são serras, na
verdadeira acepção da palavra. São paredões
abruptos (Igual a Serra do Mar, em São Paulo) que descem
escarpados para o vale dos rios, (no caso de São Paulo
para o Mar). A Serra Mariana, é nascente e delimita
o Rio Catarina, que 40 km a jusante passa na Vila das Araras,
depois deságua no Rio Pardo, que vem da grande vereda
dos Buraquinhos (Zé Bandeira).
Os companheiros chegaram, pois vinham quilômetros atrás
devido à poeira. O guia continua lendo bastante compenetrado.
Deste lugar descortina-se uma área muito grande de
toda a região. O guia nos conta muitas coisas sobre
a história e os folclores da região.
Creio que se não fosse Guimarães Rosa, e seus
épicos e memoráveis escritos, toda essa história
do passado dos sertões dos Gerais estariam no esquecimento.
Pinha de Guará: este arbusto, dá uma pequena
pinha, que segundo o guia, é comida do lobo guará,
daí o nome da planta.
Estamos no alto do chapadão, são os Gerais de
Minas. Longas estradas de terra, recobertas por grossa camada
de poeira, que se levantam no espaço. Os buracos da
estrada se nivelam na poeira, e às vezes nos surpreendem
com fortes baques. Quando se cruza com um grande caminhão,
por exemplo, não enxerga nada para frente durante um
bom tempo, aí vem o medo de um louco nos abalroar por
trás, por estarmos quase parando na pista. É
um risco! Mas com cautela, logo nos acostumamos a essas intercorrências
nas viagens por estes lugares.
Esta vista da margem da estrada, era muito comum nas rodovias
oficiais do Estado de São Paulo, 50 a 60 anos passados.
Um governador, mandou se plantasse erva-cidreira nestas margens,
para evitar a erosão e também dar um balizamento
para os veículos à noite. Com isso, o chá
de erva-cidreira, durante muito tempo, foi chamado de chá-de-estrada.
Não se esquecer que esta fotografia, de qualidade ruim,
foi tirada com teleobjetiva da filmadora. As distâncias
que aí mostram são imensas. À direita,
o retão da estrada oficial, cheia de costelas e buracos
mas bastante convidativa para os passeios de Chapada Gaúcha
para Vila das Araras e outras cidades. Importante nesta imagem
são os morros chamados de: Morro dos Dois Irmãos
(citado por Guimarães Rosa, como um referencial para
as travessias dos bandos de jagunços na região).
Vila da Serra das Araras: É lugar remoto que em 300
anos nunca deixou de ser. Único ajuntamento de casas
entre Chapada Gaúcha e São Francisco, pouco
recebe visita. A não ser quando tem festa. Na festa
de Santo Antônio em junho, a cidade enche de povo de
todos os lados, romeiros e mascates. No resto do ano, o casario
de barro adormece sob a sombra do chapadão que lhe
dá o nome. O lixo da cidade é recolhido ainda
por dois carros de bois duas vezes por semana.
Avenida da entrada na Vila da Serra das Araras. Qual a sensação
ao entrarmos em uma vila como esta? Difícil de descrever.
As pessoas nos olham como se não nos enxergassem. Nós
vemos mas, não enxergamos a essência do lugar
onde estamos entrando. As ruas poucas, empoeiradas e solitárias,
apenas um carro passando. Imaginando as distâncias,
e a solidão desta vila, começamos a entender
o verdadeiro significado que os antigos davam para a palavra:
SERTÃO.
Segundo o Dicionário Aurélio: Região
agreste, distante das povoações ou das terras
cultivadas. Zona pouco povoada do interior do Brasil, em especial
do interior semi-árido da parte norte-ocidental, onde
a criação de gado prevalece sobre a agricultura,
e onde perduram tradições e costumes antigos.
Nesta fotografia, a L-200, na praça principal, ao lado
da igreja Santo Antônio, junto com os companheiros à
sobra de uma frondosa mangueira. Os moradores do lugar estavam
também desfrutando da sombra.
Eu parei com o Andersom à frente da pensão onde
fomos encomendar o almoço. A dona da pensão
não estava, tinha ido ao sítio buscar, ovos,
frangos e verduras, somente voltaria à tarde. Tinha
duas mocinhas, depois do guia insistir resolveram fazer o
almoço para nós. Mandaram que voltássemos
depois de uma hora. Sorte! Conseguimos confirmar o almoço na pensão
(restaurante tia Elza).
Chamei de pensão? Não!
É um bar e restaurante Tia Elza. Muito humilde, nos
servimos no fogão à linha, mas a comida saborosa
e bem feita. Não me lembro o que comemos, mas sei que
comemos bem, e todos ficamos satisfeitos. O chão da
cozinha era de terra batida, havia galinhas andando pelo ambiente,
bicando os graus que caiam, e faziam seu ruído característico
de satisfação.
Não vou esquecer-me da cena. O fogão, as galinhas
andando pelo chão, o crepitar da madeira em chamas
e a alegria que reinava em todo ambiente.