VIAGEM
A SERRA DA CANASTRA
O LOBISOMEM DA CANASTRA
SÉRGIO N.
M. LIMA
Preparativos.
Íamos para a Serra: Eu (doutor), Geraldo Filho (Gege),
Fábio, Fernando, José
Fernando (Zelão), Mosca, Alexandre (Bigui), Pio e o
mentor do evento, o
Guilherme.
No dia seguinte se juntou ao nosso grupo: Pedro, Leonor, Marcelo
e Elias (Turco).
Preparando a saída:
Em primeiro lugar definir a rota para o Parque Nacional da
Serra da Canastra. Muitas pessoas, a grande maioria, não
sabem da existência desse parque, ou se já ouviram
falar, não sabem onde é.
Rota: Ribeirão Preto, Batatais, Altinópolis,
S. Sebastião do Paraíso,
Passos, Itaú de Minas, Furnas, Piumhi, Cabresto, Vargem
Bonita e São José do Barreiro.
Esta é a foto de um mapa do Guia 4 Rodas.
Este é o mapa da região onde fizemos as trilhas.
Na realidade são três os chapadões
que compõem o complexo da Canastra:
1. A Serra da Canastra,
fica mais ao norte, é chamado oficialmente de Parque
Nacional da Serra da Canastra. Tem um comprimento de 80 a
100Km e 40 a 50
Km de largura.
2. A Chapada da
Babilônia, onde está a Igrejinha sobre a qual
falaremos bastante
em nossa viajem. Separando a Canastra da Chapada da Babilônia
temos o
profundo Vale dos Cândidos por onde, após a Casca
Danta, corre o Grande Rio
São Francisco. Este lugar é um divisor de águas,
as chuvas e os rios que caem
para a direita, (Leste), são da Bacia do São
Francisco. Os rios da esquerda,
(Oeste), vão para o Rio Grande, bacia da Prata.
3.
Serra Preta , ao Sul, entre ela e a Chapada da Babilônia
tem o monumental Vão
da Babilônia. A Serra Preta é o contra forte
da Barragem de Peixoto. Assim, no
alto da serra, quando se cruza a Trilha do Céu, a visão
da Represa de Peixoto no Rio Grande é alguma coisa
maravilhosa.
Para se subir do Vão da Babilônia para a Chapada
da Babilônia, temos a subida da
Pedra Branca que é o tira teima dos Jipeiros e motoqueiros.
Por sinal, é a passagem do Rally dos Sertões.
Na encosta Sul da Serra Preta, vê-se a represa de Furnas.
Nota-se no mapa que a Cidade de Capitólio, onde está
o famoso condomínio de Escarpas do Lago, a bacia hidrográfica
do Rio Grande quase se encontra com a Bacia Hidrográfica
do Rio São Francisco, foi feito uma barragem para que
não houvesse
transposição das águas de uma bacia para
outra.
Esta é uma cópia de um Mapa da Força
Aérea Americana, USAF (1975)
Este é um mapa mais ampliado do anterior, assinalando
os pontos por onde andamos.
1. Portaria para
entrada no Parque Nacional da Canastra na frente de São
Roque de Minas. Paga-se uma pequena taxa para entrar, aposentado
não paga, mas não tive coragem de me apresentar
como tal...
2. Nascente do
Rio São Francisco, é impressionante imaginar
aquela pequena
mina, formando um límpido riacho, correndo manso pela
chapada, com
cardumes de lambaris nadando displicentes e tranqüilos,
vai se poluindo e
poluindo, dejetos de centenas de cidades são lançados
nele, até que poluído e
quase exaurido deságua escuro e triste no azul do Oceano
Atlântico. Quando se passa de avião no delta
de sua foz, percebe-se a escura mancha do
caudaloso rio, maculando o azul do oceano. No delta do rio
era um proliferar
de vida, hoje um asfixiar de morte.
3. No ponto 3 é
a Casca Danta, onde o rio se precipita do Chapadão
da Canastra
para o Vale dos Cândidos, uma queda de mais de 170metros.
É um lugar
simplesmente maravilhoso e soberbo.
4. A Igrejinha.
O ponto mais alto do Chapadão da Babilônia e
seu limite com o vale.
5. Subida da Pedra
Branca.
6. No ponto A,
está a Pousada Recanto da Canastra do Sr. Soares, um
ponto de
referência na Marcação do GPS Sul 20 -
21 - 435—W: 46 - 29 - 129.
7. Marcação
do Posto de Abastecimento em São José do Barreiro,
GPS, Sul 20 – 20 – 433-------W: 46 – 29 – 092. è um
ponto importante, pois
antigamente não havia abastecimento por lá e
“era fogo”. Já chegamos a
comprar gasolina à custa de muita conversa, do tanque
de um fusca .
8.
Após o Chapadão da Babilônia vem a Serra
das Sete Voltas.
Nestas fotografias estamos na frente da casa da fazenda. O
Bayou já sobre a Silverado Z71 e as motos, do GG e
do Fábio na carreta.
Fazia muito tempo que eu não participava de uma trilha
com meu quadriciclo (Bayou), assim, antes de irmos, eu Gege
e Fábio, fomos para a Fazenda São Joaquim darmos
um treinamento e testarmos os equipamentos para ver se estavam
em ordem. Lógico que tendo passado pelas mãos
do grande Mércio (Baianinho), "era certeza”, como
diria o Zelão.
Em nosso teste percorremos 100Km de trilhas, fomos à
Casa Branca e na fazenda do saudoso José Cássio.
Muitas recordações, muitas histórias
nós relembramos, passamos pelo centenário Sobradão,
Campinho, Santa Maria, Tanquaruçu, Santa Adelina...
Aos 61 anos de idade o que mais nos resta são ’causos’,
e recordações.
No domingo antes do almoço carregarmos o Bayou e as
motos e fomos para Ribeirão Preto, de onde sairíamos
para a Serra..
A SAIDA DE RIBEIRÃO
PRETO:
Saímos da casa do Gege as 21:00H pois esperamos o Zelão
que vinha de São Paulo, por sinal veio bem rápido,
hoje existem muitos radares fotográficos nas estradas
e correr acima do limite é risco.
Nossa primeira parada foi em Itaú de Minas, para abastecimento
das caminhonetes e providenciarmos alguns itens gastronômicos.
O Fernandão, meu sobrinho, estava com a fome vencida
e pegou firme; o Zelão, com a fome viajada pegou mais
leve um pouco.
Saímos para Piumhi onde iríamos pegar a estrada
para Vargem Bonita, São José do Barreiro entrada
para a Serra da Canastra.
Quando saímos da estrada para Belo Horizonte (Br),
que por sinal não é fácil de “navegar”,
um trânsito terrível: Caminhões em pencas,
as estradas com curvas de 50 anos atrás, do tempo que
o máximo era o Jipinho 51, cuja velocidade de cruzeiro
era 50 Km e os caminhões transportavam no máximo
a “tara” 6.000Kg..
Entramos em Piumhi,
passamos por dentro da cidade e proamos para a Serra da Canastra,
tudo mudou, não havia movimento.
Deu tempo de olhar a azul tela do GPS e vermos que já
havíamos percorrido 270Km, com uma velocidade média
de 72Km/h, e na tela a rota descrevia uma curva em ângulo
reto, para o norte, em direção a Serra. Para
nós trilheiros estávamos em casa.
A lua cheia havia nascido a nossa direita, iluminando toda
a paisagem e desenhando bem ao longe a silhueta da serraria,
nosso destino 70 km à frente.
A estada de terra estava como o diabo gosta, cheia de buracos
e com um palmo de poeira, o companheiro Guilherme que sempre
se manteve na minha cola, lógico se perdeu na cortina
opaca e densa, que formava um canudo com a nossa passagem,
impossibilitando a visão. O ar estava parado, assim
a poeira para se dispersar demorava muito, o Guilherme tinha
que parar a caminhonete, esperar a poeira abaixar para não
fazer vôo cego e se deparar com uma vaca no colo, pois
lá elas gostam de ficar no meio da estrada
Ao longe em uma
subida, vi, como se fosse uma gravata de mau gosto, cinza
e branca, alguma coisa atravessada na pista, ao nos aproximarmos
ela começou a mexer. Susto. Pé no breque. Ao
nos aproximarmos mais, vimos uma grande cobra cascavel que
atravessava a pista de terra, deixando na espessa poeira seu
rasto fantasmagórico. Com isso o Guilherme e o Fernando
se aproximaram, mas não deu tempo para verem o grande
e peçonhento ofídio que havia atravessado a
pista. Aproveitamos para parar e tirar “água do joelho”.
O Fernandão com sua voz tonitruante foi logo dizendo:
- Até que enfim vocês pararam. Estamos tentando
nos aproximar há muito tempo.
- O que manda Fernandão?
- Puxa tio o senhor está com os lanches! Solta a merenda
para cá, até aqui somente comemos terra.
Olhei no banco de trás, e realmente, o lanche dos dois
companheiros havia ficado também conosco, que negra,
heim?
Saímos logo,
para tomarmos distância dos companheiros. Logo pegamos
uma abrupta descida, era o vale do majestoso Rio São
Francisco. Ao final de uma descida, íngreme e cheia
de buracos, atravessamos uma modesta ponte, bem estreita mesmo,
do Velho Chico, ainda próximo de seu nascedouro na
Canastra. Mesmo com o plenilúnio, não foi possível
ver o rio, pois naquele ponto ele passa muito fundo em sua
calha que por sinal é toda atapetada de pedras e matacões.
É bastante emocionante passarmos pelo Rio São
Francisco, pois é o verdadeiro rio da integração
nacional, mesmo sem tê-lo visto, eu e os companheiros,
Zelão e Gege pudemos sentir sua força.
A subida à frente era bem íngreme, mas não
foi necessário ligar 4X4.
Logo deixamos a estrada de São Roque de Minas e pegamos
a esquerda para Vargem Bonita, depois de 20 Km uma forte e
longa descida e ao final, novamente o Rio São Francisco,
novamente uma comprida e estreita ponte, que termina na entrada
da cidade.
Nunca me esqueço que, há 10 anos atrás,
passando por esta pequena cidade, dos rincões de Minas
Gerais, a perua do Gege, deu um problema e paramos em um mecânico
para reparo. Era o único profissional da cidade. Na
casa dele nos informaram que ele tinha ido pegar peixe no
São Francisco. Não deu tempo de nos preocupar,
pois logo a mãe mandou o menino chamar o pai. Eu havia
me esquecido que o Rio São Francisco passava no fundo
da oficina do mecânico.
Quando ele retornou, trazia um balde cheio de lambaris. Perguntei
se ele estava usando tarrafa? .
-Não, companheiro. Peguei com o meu chapéu.
Bem, sou pescador mas aquela era forte demais. Fui obrigado
a trucar em cima!
- Bem, o senhor pode descer até ali no rio e ver o
cardume de lambaris e ferrerinhas que estão passando
por lá, aí o senhor me conta. Lá fui
eu, com o menino, caminho a baixo ver o Velho Chico. Surpresa
total. Estava passando pela cidade, um cardume de lambaris,
de mais de 2 Km. Era muita gente, com peneiras, baldes, etc,
pegando os lambaris. Somente havia visto, semelhante espetáculo
no Rio Miranda lá no Pantanal de Mato Grosso do Sul.
Logo estávamos na poeira da estrada, enfrentando os
últimos 20 Km da viajem para São Roque de Minas,
na Fazenda Boqueirão do mineiríssimo Sr. Soares.
Dia 04-08-2001- Sexta-feira.
Não seria necessário dizer que os primeiros
a pedirem o café da manhã lá no Sr. Soares
são os micos. Pequeninos macacos que dão vida
à mata.
Eles chegam em levas, são muitos e bem disciplinados.
Não tumultuam o ambiente, os líderes de cada
grupo se alimenta, depois as fêmeas e os filhotes em
seguida como sombras, caminhando pelos galhos, desaparecem
na vegetação.
Grande café matinal:, eu como sempre pronto, chamando
a caterva. A fome do pessoal estava muito antiga e bastante
viajada. Fabião e Mosca campeões. Gege não
estava muito bem para comer, mas quando lembrou que tinha
seu vidro de bicarbonato na algibeira, atacou como gente grande
mesmo.
Seu Soares somente ia passando e passando, e falando:
- Bem esta turma é forte mesmo, heim doutor!
As
Silverados com as cargas chegaram muito bem. Mão de
obra, vamos começar a descarregar as máquinas
pois as trilhas estão chamando.
Sempre temos numerosos lugares para visitarmos e por onde
iniciar, gera constantemente discussões.
Nossa primeira opção foi a cachoeira da Casca
D”Anta , minha grande curiosidade era ver como ela estava,
devido a grande seca que atravessamos, como estaria a queda
de água.
A primeira parada após sairmos da Pousada é
em São José do Barreiro. Uma pequenina cidade
no alto da colina, perdida no tempo. Na fotografia vemos ao
fundo a Serra da Canastra e no topo à frente, na elevação,
o povoado. Aí estão, o bayou a moto do Gege
e eu de motoqueiro.
São José do Barreiro, não é lugar
para se guardar o nome, não é lugar inscrito
nos mapas, mas é um recanto para nunca mais se esquecer
pois fica marcado no coração, quanta paz, quanta
humildade e gentileza das pessoas ainda existe por lá.
Como apagar da memória, um recanto ao pé da
Serra, que tem por divisória o início do histórico
Rio São Francisco, pois no vale entre a cidadezinha
e a Serra da Canastra corre o encachoeirado e ainda jovem
o “velho Chico”?
Na
estrada, muita poeira, no céu, nuvens caminhando calmamente
no azul imaculado de um céu absolutamente limpo.
Antes de irmos a Casca D´anta, resolvemos, após
abastecermos as motos ver o Rio São Francisco, que
como eu disse passa muito próximo ao povoado. O companheiro
Guilherme vendo aquela água cristalina e o rio com
tão pouca água, abandonou a ponte e atravessou
por dentro da água. Eu também não resisti
e mais tarde passei com o Bayou também, cortando o
grande rio a vau.
Guilherme atravessando o Rio São Francisco. A água
estava tão transparente que podia-se ver o fundo, grandes
pedras como já me referi atapetam o leito do rio. Essas
pedras já foram várias vezes removidas, pois
nesta área há tempos achou-se muitos diamantes
por aí. Quando eu atravessei o rio com o quadriciclo
ele deu uns pulos de arrepiar nestas pedras – Bem, tudo pela
aventura e a adrenalina, que é bom para desobstruir
as veias dos velhos.
Aí está o Bayou sobre a ponte de madeira do
Rio São Francisco. O Guilherme havia atravessado o
rio, mais tarde eu criei coragem e atravessei também
Aí estão os Biguis: Mosca, Fábio e Gege.
As trilhas são assim, quando muito boas, são
cheias de poeira e buracos
Este trecho da estrada vai da pousada do Sr. Soares para São
José do Barreiro
O
primeiro desafio, foi essa subida no alto do morro, na fotografia
não representa o quanto à subida é íngreme,
e com as pedras soltas pela rampa a fora é um desafio
significativo subi-la sem tomar um chão.
Mas tem também as trilhas de aquecimento. O Gege por
segurança subiu esta trilha a pé e diga-se,
pé ante pé, pois segundo ele, se rolasse, somente
pararia dentro do São Francisco.
Pode-se dividir esta rampa em dois estágios, a área
do embalo, e após a curva que a coisa fica feia mesmo,
é a área dos tombos. Pode-se ver ao fundo da
foto o Rio São Francisco em um trecho logo abaixo da
Casca Danta.
No início o embalo ..... no topo da subida, os tombos.
Antes da Casca D´anta resolvemos dar um treino e subimos
no alto de um morro, que era o tira teima dos motoqueiros.
Eu com um pouco de medo subi também, não se
pode negar que dá um frio na barriga.
Aí estão: Bigui (Alexandre), Mosca, Zelão,
Fabião, Gege e eu (Doutor), por sinal o decano da caravana.
A morena da foto não fazia parte da equipe, estava
lá passeando com o pai.
Na fotografia pode-se ver bem ao longe na Serra da Canastra,
a cachoeira da Casca D´anta, aparece como um pequenino
risco branco cortando a serra, no lado esquerdo de meu ombro,
é lamentável essa seca inclemente, que assola
o Brasil.
Esta é a vista do lugar onde estamos na fotografia
anterior. Um alto morro no contraforte da Chapada da Babilônia.
De frente para a Casca Danta aquela pequenina Igrejinha.
No detalhe pode-se observar as trilhas, e o Elias, o Turco,
arrancando com sua Ranger, sem 4X4, para chegar ao topo do
morro.
Vê-se no detalhe que o piloto arrancou com tudo.
Uma nuvem de poeira branca traçou um cone na retaguarda
da caminhonete atestando o pé na tábua e o sangue
quente.
Como diria e velho Adhemar, era fé em Deus e pé
na tábua.
A caminhonete jogava pedras para todos os lados, andava de
lado e pouco a pouco, metros para frente.
O cheiro de pneus queimados já chegava até nós.
A torcida era grande, mas infelizmente parece que a subida
era bem maior.
Tentou de tudo, deu ré, voltou no pé do morro,
tentou vir pelo meio do pasto, muitos pulos, solavancos, pedras
que volvam para todos os lados, mas...
Mas... do pé do morro não passou... Desceu da
caminhonete, rindo e subiu a pé mesmo até o
topo. – Bem pessoal, subi eu não subi, mas abri uma
nova trilha lá na rampa...É isto mesmo, tentar
sempre desistir nunca.
Estrada
para a subida da Igrejinha, parece a Trilha do Céu.
Este sítio da foto, parecia, se instalar no meio do
nada. Ao fundo da gleba uma queimada, deixando uma mancha
escura e triste na paisagem. Era como se fosse uma ferida
na terra desnuda
Somente o gado, no curral, que muito mal podem ser vistos
na fotografia, animais já emagrecidos pela seca, que
lentamente se deslocavam no curral, talvez em busca de uma
palha seca, mas ainda palatável, é que nos trazia
à realidade de que, aquilo realmente era uma propriedade
rural e não um quadro que havíamos pintado em
nossa imaginação. A foto mostra ainda os numerosos
ipês amarelos floridos.
O caminho da Igrejinha não era fácil. A trilha
vai serpenteando serra acima. O quadriciclo é bastante
eficiente nessas situações, mas em muitas curvas
ele sai de lado e precisa mesmo ser pilotado. Ele é
semi-hidramático o que facilita muito nos momentos
mais críticos das trilhas.
O que mais chamou a atenção, no meio da seca
terrível, eram os inúmeros pés de ipês
amarelos, que estavam simplesmente maravilhosos, o amarelo
genuíno da bandeira do Brasil, não tinham mais
folhas e os galhos simplesmente desapareciam no meio da floração.
As flores que caiam, e eram muitas, servem de alimento para
os animais selvagens como: Veados, pacas, quati e outros.
A busca pela Igrejinha nos mantêm na trilha, passamos
batidos pela Casca Danta, o magnetismo era a Igrejinha, por
ser um lugar místico e por sinal, o ponto mais elevado
da região.
No complexo da Canastra a sensação de profundidade
é incrível, as três dimensões do
espaço, lá é possível ser tocada
com o espírito e sentida com o coração.
Ah! Se eu fosse um ermitão, ah! se meus compromissos
desaparecessem , gostaria de vagar por aquelas trilhas, como
a sombras das nuvens (cúmulos), que indiferentes às
ravinas e escarpas, placidamente caminham pelos infindáveis
descampados da Canastra.
Esta é a Igrejinha. Há 10 anos tenho ido orar
a seu redor. Nunca consegui a chave, nunca encontrei ninguém
lá que não fossem nós mesmos.
Um alemão, ao encontrar esta Igrejinha, perdida no
meio destes chapadões, sentiu uma força muito
grande e patrocinou sua reforma. Mandou construir também
este pequeno barracão ao lado, para os viajantes se
abrigarem do sol e da chuva sem necessidade de arrombar a
capelinha e assim foi feito.
Passados alguns anos, o jovem alemão, saiu de seu país
com a noiva e família e veio se casar neste lugar,
por acreditar ser aí um lugar muito especial neste
vasto mundo de meu Deus.
Estava eu nestas meditações e conjecturas, olhando
as distâncias, observando as nuvens no azul do céu,
quando o canto de um pássaro inundou o ambiente com
sua harmonia, tão singela que todos nós ficamos
em silêncio para ouvi-lo. Naquele momento, cada um pode
sentir no fundo do coração a presença
inquestionável de Deus, como o criador, como o pai,
como a razão de sermos o que somos, ínfimos
no espaço e infinitos no amor.
Este é o tico-tico, que no alto da Serra, com seu singelo
canto, nos polarizou na fé, criando um momento de rara
paz e tranqüilidade em nosso coração. Sem
dúvida, era um mensageiro Dele. Sentimos que se naquele
momento voltássemos para casa, nossa viajem já
havia sido um sucesso de realizações e introspecções.
Esta é a subida para a Capelinha, curvas após
curvas, até a última na reta da chegada. Dois
companheiros chegando mansos.
Ao fundo, projetada na encosta da Serra da Canastra a sombra
expressiva de uma nuvem, de cúmulo de bom tempo, a
vagar lentamente pelos descampados da região, era como
uma nave ciclópica que metamorfosiando-se descia pelo
vale dos Cândidos.
Eu, Gege e Zelão, estamos de frente para a Igrejinha,
lá ao longe pode-se ver a sombra de São José
do Barreiro.
À noite as luzes de Piumhi , aparecem bem distintas
no horizonte distante.
Na foto eu e Gege estamos mais de lado, em relação
à capelinha, mas ainda na frente da igrejinha, na nossa
retaguarda a estrada e o início do Vale dos Cândidos,
como nesta encosta, no sábado à noite nós
vimos o Lobisomem da Canastra acho importante localizar o
lugar. Bem, a historia deste fantasma fica para o fim.
Aí está o casal simpatia da caravana. Veneziano
e Leonor. Gente finíssima, por sinal estas fotos que
se seguem são dela. O Veneziano, mesmo com a perna
quebrada é um grande companheiro. Chega-se a esquecer
que ele está com esse problema.
Na primeira foto, ele está no ranchinho da Igrejinha,
na segunda foto está no início da ravina do
Lobisomem da Canastra, no fundo da foto a monumental Serra
da Canastra. Este ponto, é o limite norte do Chapadão
da Babilônia.
Bem aqui estamos todos atrás da Igrejinha:Veneziano,
no Jipe, eu, Marcelo, Elias (Turco), Fernandão (Mamute).,
o Bigui, ao fundo da fotografia visbumbra-se o longo e íngreme
vale dos Cândidos, que praticamente termina na Garagem
de Pedra.
Os fatos importantes
a serem considerados são: Este é um outro dia,
já no sábado, havíamos chegado até
a Igrejinha pela Chapada da Babilônia pela “Serra do
Rolador”, melhor seria chamar subida do Rolador, que é
um outro caminho, do qual irei mostrar algumas fotos. A Ford
do Turco não ligou a tração, 4X4 o que
foi motivo do Marcelão falar bastante, tirando o pelo,
do companheiro. Como conseqüências dias depois
o Turco, aborrecido e um pouco traumatizado, rachou a caminhonete
em um muro e de sobremesa um poste, para dar PT, e ele está
comprando uma nova máquina.
Aí está o veterano Gege, foi realmente o descobridor
da Serra da Canastra. “Há muitos anos com meu filho
na garupa, fiz esta viajem, com minha possante 350. É
mole Bicho! Ainda estava com o Fabinho na Garupa e chovia
sem parar. Levei mais de 5 tombos. Quando cheguei na pensão
da Ivanilde, já à noite, foi a glória.
E foi mesmo, Gege. Esta viagem do Gege saiu publicada em uma
revista
Aí ele está no topo da Serra do Rolador, ao
fundo a Canastra. Mais à frente 15 Km a subida da Pedra
Branca, famosa.
Pode-se ver o solo queimado e ressequido, é incrível
a recuperação deste solo arenoso e queimado.
Com as primeiras chuvas, há uma brota geral de toda
a vegetação. Muitas áreas ficam por centenas
de hectares recobertas de lírios azuis dos campos de
altitude.
Aí estou com o Bayou. Estas campinas douradas, com
ondulações ininterruptas e infindáveis,
nos dão uma vontade louca de andar.. andar sem destino
e sem parada. Vontade de surfar nas ondas da macega suavemente,
para que o caminho nunca chegue ao fim.
A parada, a fotografia, é a concretização
do momento e a cristalização de uma emoção,
caso contrário, isto seria esquecido como tantos outros
momentos de pura adrenalina que já passei.
À distância tudo se confunde, e as poeiras das
motos traçam trilhas no horizonte, como se fossem as
trilhas de condensação no espaço, deixadas
por pequenas naves terrestres, visualizam-se assim as rotas,
localiza-se às distâncias e caminhos e aquilatando-se
o espaço.
Sobe-se pelas encostas depois, desvia-se das pedras e dos
cupinzeiros buscando o melhor caminho para o retorno. Nestes
momentos a máquina e o corpo têm que manter perfeito
equilíbrio, senão a gravidade leva a melhor,
e...
Estou aí descendo uma vertente no meio do Chapadão
da Babilônia para o vale que delimita a Serra onde está
a Igrejinha, a guardiã da Canastra.
Tudo era dourado, a luminosidade incrível em um cenário
de rara beleza, é olhar a foto e imaginar a beleza
do vale.
Não parece na fotografia mas esta descida era muito
íngreme mesmo, o capim muito alto às vezes esconde
grandes pedras que nos toma a direção dando
um arrepio dos bem fortes.
Depois deste trajeto chegamos na já famosa Casca Danta.
Antes contudo tenho umas considerações do caminho
a relatar:
Subida
do Rolador para o Chapadão da Babilônia. Neste
momento a máquina do Elias, não acionou a tração,
4X4, como já disse ele ficou meio louco, “nervoso”
demais. O Marcelão, entrou por baixo e calçando
com pedras, o Turco feroz, queimando os pneus foi aos pulos
e trancos subindo a Serra do Rolador.
Mas olhem bem como ele ficou depois da Epopéia: Amor
próprio ofendido, não teve outro jeito, ficou
com as calças fora do rego, tentei dar apoio, mas não
adiantou, eu já lhes contei o que ele fez depois em
Ribeirão Preto
Sente-se muito pequeno neste lugar. A altura da Serra da Canastra,
de mais de 210m, impressiona muito. A erosão da água
na encosta da Serra, abrindo uma fenda muito expressiva na
silhueta da montanha, nos faz pensar nos 50 milhões
de anos destes acontecimentos geológicos e nós
passamos por esta vida tão fugazmente, que realmente
não temos o direito de mudarmos o ritmo da natureza.
Com maior aproximação pode-se constatar como
o Rio São Francisco está com pouquíssima
água.
Nunca em tempo algum eu vi a cachoeira com essa quantidade
de água.
É o fogo das queimadas, é a terra arada, é
a mata galeria destruída, é a ecologia abandonada,
é o homem em perigo e o grande perigo que é
o homem...
Aí está o retrato de nosso tempo, é a
água que falta, é a energia que gasta, é
a poluição que devasta, é a vida que
passa...
Passa a vida, passa o tempo, nós muitas vezes sem tempo
para ver a vida passar.
Marcelo e Veneziano, no caminho da Casaca Danta para São
José do Barreiro, o Jipe do Veneziano é valente
mesmo
O Vitara, pilotado pela esposa do Veneziano, que dizia não
saber pilotar, passou tranqüila por toda a trilha, é
dose, para os machões de plantão
Esta é uma fotografia muito importante, tirada pela
grande Leonor, da Represa de Peixoto estando posicionada no
alto de uma trilha na Serra das 7 Voltas.
Estas fotos da Serra das 7 Voltas, foram tiradas no percurso
de volta do Sr. Soares para Ribeirão Preto.
Pode-se notar como o nível da represa está muito
baixo, devido a uma das maiores secas que tem atingido o Centro
sul do Brasil.
Uma visão geral das duas fotografias anteriores da
Serra das 7 Voltas, ao fundo Peixoto, é uma trilha
maravilhosa.
O LOBISOMEM DA CANASTRA
Sérgio N. M. Lima.
Estávamos
no alpendre da Pousada Recanto da Canastra do Sr. Soares.
Eram 21:00h, o vento rugia forte na Serra da Canastra. Da
pousada podia-se ver a tênue luz da pequena cidadezinha
de São José do Barreiro.
A prosa era animada demais, pois havíamos feito muitas
trilhas, e assim sendo fatos e boatos não faltam para
serem contados. Havíamos jantado na cozinha, ao lado
de um grande fogão de lenha, uma saborosa leitoa com
todos acompanhamentos que “minas” muito bem sabe fazer.
No momento em que uma lua cheia, incrivelmente grande, e maravilhosa
iluminou toda a Serraria, a conversa virou para o sobrenatural.
O clarão da lua por trás das árvores,
desfolhadas pela seca, contrastava galhos retorcidos e despertava
a imaginação.
Lobisomem, mula sem cabeça, negrinho de olhos verdes
brilhantes do São Francisco e até disco voador
estava rolando na conversa.
Eu relatei ter visto um disco voador, há anos lá
na Serra da Mantiqueira e que no alto da Igrejinha seria o
ponto ideal para termos um novo contato com um OVNI.
Não precisou mais nada. A turma se arrepiou e em poucos
minutos estávamos todos com nossas roupas próprias
para retornarmos no alto da Chapada da Babilônia, pelo
caminho que margeia o Rio São Francisco.
Fernandão, o Mamute, falou que sua moto não
tinha farol assim teríamos que ir de parelha para eu
ir iluminando o caminho para ele. Saímos na frete.
Íamos sair aos poucos devido à poeira que estava
incrivelmente espessa.
Mandamos brasa. A noite linda e gelada, com todos equipamentos
o vento frio ainda passava pelo capacete.
Em uma curva, no meio de uma mata galeria, as margens do São
Francisco, o facho do farol iluminou uma cabeça de
boi ensangüentada no meio da pista em uma pronunciada
curva. Brecada, expectativa, tocamos lentamente, ao completarmos
a curva, um espetáculo grotesco, dois homens descarnando
um boi, no meio da poeira. Passamos ressabiados eles nem se
mexeram ou levantaram o rosto.
Incrível, à tarde quando passamos pelo caminho
aquele boi, por algum motivo, já estava morto no meio
do caminho Mundão louco por esses lados.
Depois de 30 minutos de “marcha forçada” estávamos
lá no altão novamente.
No início, ouvia-se somente o agudo e ininterrupto
barulho do vento varrendo distâncias. Logo depois bem
ao longe, duas luzes, ziguezagueando pelos meandros das curvas,
logo depois outras mais, o barulho das motos quebrado a harmonia
do lugar, nos mostrava os companheiros empenhados na trilha
da Igrejinha.
Chegaram turbulentos. Depois foram se acalmando. O Gege viu
um satélite em rota equatorial. Alguns grandes aviões
cruzaram o espaço. A Serra fica na rota da represa
de Furnas, as aeronaves que vêm do norte (USA) geralmente
usam esta rota para o aeroporto de Guarulhos.
Depois de um certo tempo, e muito a tempo, a esposa do Veneziano,
com seu jeito peculiar sugeriu ao grupo que fizesse silêncio
para ouvirmos a natureza.
No início o barulho do vento, com aquele ruído
branco fazia todos outros sons desaparecerem, com o passar
do tempo o ouvido se acostuma e começamos ouvir outras
vozes da natureza.
Uma coruja caçadora perseguindo um rato, com seu canto
fúnebre. O noitimbó ou curiango esvoaçando
atrás dos insetos e assim por diante.
Repentinamente começou um barulho “sui generis” eu
nunca havia ouvido antes. Fiquei na escuta. Não era
minha imaginação era um ruído muito bem
definido e estranho.
Na minha mente parecia a alma do boi morto na estrada se debatendo
na ravina a nossa frente, nestes momentos parecia eu ouvir
o chifre do boi ensangüentado cavando a terra. Como se
ele tivesse sido atropelado por um de nós e voltado
para justiça, é a imaginação funcionando
no meio da noite. È a mula sem cabeça é
a cabeça do boi, é a imaginação
é nosso medo atávico do tempo das cavernas.
O relógio digital de alguém tocou, era uma hora
inteira, 21:00 ou 24:00, não sei e também não
importava, naquele momento.
Olhei para o Gege ele também havia escutado. Os outros
ficaram estarrecidos e francamente não sabíamos
ou era.
Levantei, amedrontado, e pé ate pé, me dirigi
para a ravina para ver o que era o rouco ruído, que
ora era alto, ora parava, ora era em um lugar ora no outro.
Ao chegar na ravina, arrepiei. A lua, maravilhosa e muito
clara, iluminou um escuro cupim, quando prestei atenção
o cupim começou a andar. De repente eram dois cupins
andando, depois de um momento se juntaram em um somente e
de escuro ficam brancos.
Estarrecido, fiz sinal para o Gege vir, ele veio e mais um
pouco da turma. Ficamos todos boquiabertos com aquilo que
víamos.
Houve um momento que o cupim aumentou de tamanho e parecia
ter chifre, era realmente de arrepiar.
Não se descreve o sentimento nesses momentos.
Eu e o Biguí, fomos até o quadriciclo, e o empurramos
até a ravina para acendermos o farol de milha e vermos
com o facho se realmente seria um lobisomem, o Lobisomem da
Canastra.
Quando o facho, iluminou a ravina, nossa decepção,
eram dois grandes tamanduás abrindo e comendo cupins
nas plácidas campinas da Canastra.
Bem se não existisse a luz seria um causo real de lobisomem
da Canastra, visto por uma caterva de machões.
O Bando de “Calapalos”
da Canastra.
Olhem bem, com muita atenção, a alegria da caterva
depois que o lobisomem se transformou em dois tamanduás.
Na primeira: Doc, Fernando, Gege, Turco, Marcelo, Guilherme,
Veneziano, na segunda a Leonor.